terça-feira, 31 de julho de 2012

é hoje!

                        
   
O TEMPO

O tempo só anda de ida.
A gente nasce, cresce, envelhece e morre.
Para não morrer eis a ciência da poesia:
Amarrar o Tempo no poste!
E respondo mais: dia que estiver com tédio de viver
é só desamarrar o Tempo do poste!

     
MANOEL DE BARROS

domingo, 29 de julho de 2012

ricardo reis

                                 
arte de costa pinheiro                        














Uns, com os olhos postos no passado,
Veem o que não veem; outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, veem
O que não pode ver-se.

Porque tão longe ir pôr o que está perto –
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo.

Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele.

                               
                          RICARDO REIS

quinta-feira, 26 de julho de 2012

santo agostinho

        
14. O conceito de tempo
                                                 
[...]
      
O que é realmente o tempo? Quem poderia explicá-lo de modo fácil e breve? Quem poderia captar o seu conceito, para exprimi-lo em palavras? No entanto, que assunto mais familiar e mais conhecido em nossas conversações? Sem dúvida, nós o compreendemos quando dele falamos, e compreendemos também o que nos dizem quando dele nos falam. Por conseguinte, o que é o tempo? Se ninguém me pergunta, eu sei; porém, se quero explicá-lo a quem me pergunta, então não sei. No entanto, posso dizer com segurança que não existiria um tempo passado, se nada passasse; e não existiria um tempo futuro, se nada devesse vir; e não haveria o tempo presente se nada existisse. De que modo existem esses dois tempos – passado e futuro , uma vez que o passado não mais existe e o futuro ainda não existe? E quanto ao presente, se permanecesse sempre presente e não se tornasse passado, não seria mais tempo, mas eternidade. Portanto se o presente, para ser tempo, deve tornar-se passado, como podemos dizer que existe, uma vez que a sua razão de ser é a mesma pela qual deixará de existir? Daí não podermos falar verdadeiramente da existência do tempo, senão enquanto tende a não existir.
   
           
20. Só de maneira imprópria se fala de passado, presente e futuro


Agora está claro e evidente para mim que o futuro e o passado não existem, e que não é exato falar de três tempos  passado, presente e futuro. Seria talvez mais justo dizer que os tempos são três, isto é, o presente dos fatos passados, o presente dos fatos presentes, o presente dos fatos futuros. E estes três tempos estão na mente e não os vejo em outro lugar. O presente do passado é a memória. O presente do presente é a visão. O presente do futuro é a espera. Se me é permitido falar assim, direi que vejo e admito três tempos, e três tempos existem. Diga-se mesmo que há três tempos: passado, presente e futuro, conforme a expressão abusiva em uso. Admito que se diga assim. Não me importo, não me oponho nem critico tal uso, contanto que se entenda: o futuro não existe agora, nem o passado. Raramente se fala com exatidão. O mais das vezes falamos impropriamente, mas entende-se o que queremos dizer.
                                                                       
                                               
SANTO AGOSTINHO  
("Confissões"  trad. Maria Luiza Jardim Amarante.  São Paulo: Paulus, 1984.)

quarta-feira, 25 de julho de 2012

* surrupiado do blog acontecimentos
             
                                          
O mundo de Dante era finito e por isso pôde traçar a geografia do inferno, do purgatório e do paraíso. Mas esse mundo limitado era eterno: os homens estavam destinados a viver pelos séculos dos séculos e, depois do Juízo Final, sem experimentar mudança alguma. A eternidade dissipa o tempo e a sucessão. Seremos para sempre o que somos. Nisso consiste a diferença radical entre o mundo medieval e o moderno. O cristão medieval vivia num espaço finito e estava destinado à eternidade dos bem-aventurados ou dos réprobos; nós vivemos num universo infinito e estamos destinados a desaparecer para sempre. Nossa condição é trágica num sentido que nem os pagãos da Antiguidade nem os cristãos da Idade Média suspeitaram.  
                                                                                                               

                                                  OCTAVIO PAZ
                                                      
[PAZ, Octavio. "Poesía y modernidad". In:_____. La otra voz. Poesía y fin de siglo. Barcelona: Seix Barral, 1990.]

segunda-feira, 23 de julho de 2012

octavio paz (II)

              
QUARTO DE HOTEL


I

À luz cinzenta das reminiscências
que anelam redimir o já vivido,
é que arde o ontem fantasma. E então sou este
que dança aos pés das árvores, delira
com nuvens que são corpos que são ondas,
com corpos que são nuvens que são praias?
Eu sou alguém que toca e canta as águas,
a nuvem e voa, a árvore e sem folhas,
um corpo e se levanta e que contesta?
Arde o tempo fantasma:
o ontem arde, o hoje queima-se e o amanhã.
Aquilo que eu sonhei dura um minuto
e num minuto apenas, o vivido.
Que importam se são eras ou minutos?
Também o tempo de uma estrela é tempo,
gota de sangue ou fogos: piscar de olhos.


II

Lava o meu rosto com suas mãos frias
o rio do que passou, suas memórias
correm sob minhas pálpebras de pedra.
Não se detém jamais sua corrente
e eu, a partir de mim, sou eu que o verto.
É de mim que urge o passado?
Corro com ele e aquele que o verte
é apenas uma sombra, e me finge, oca?
Talvez ele nem corra: ao que eu me afasto,
sequer me segue, alheio, consumado.
E quem já fui estaca na ribeira.
Não se recorda nunca, não me busca,
não me contempla e nem de mim despede-se:
contempla, busca um outro fugitivo.
Um outro que no entanto não se lembra.


III

Nem antes nem depois. O que eu vivi
será que ainda o estou vivendo agora?
O que eu vivi! E acaso eu fui? E flui:
o que eu vivi estou morrendo ainda.
O tempo não tem fim e finge lábios,
minutos, morte, céus, e finge infernos,
portas que dão no nada e ninguém cruza.
Não há fim, nem paraíso, nem domingo.
Não nos aguarda Deus finda a semana.
Dorme, não o despertam nossos gritos.
É apenas o silêncio que o desperta.
Quando tudo se cale e já não cantem
os sangues, os relógios, as estrelas,
Deus abrirá seus olhos
e ao reino de seu nada voltaremos.

            
tradução: rodrigo madeira
                                   
poema no original

sexta-feira, 20 de julho de 2012

               

















     
MORALIZA O POETA NOS
OCIDENTES DO SOL A INCONSTÂNCIA
DOS BENS DO MUNDO
                                                                                           
                         
Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.
                    
Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?
                
Mas no sol, e na luz, falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.
                             
Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.


                            GREGÓRIO DE MATTOS GUERRA

terça-feira, 17 de julho de 2012

segunda-feira, 16 de julho de 2012

bowie

                
 NÃO COMPRE RELÓGIOS NOS EUA!/ OU DANE-SE 
LACTA!/ ETC (clique rápido no "x" do maldito anúncio)      



TIME MAY CHANGE ME
BUT I CAN´T TRACE TIME

domingo, 15 de julho de 2012

aulas de solidão (13)

*(dos poetas e seus leitores)
                        
     
Só o tempo, com o tempo, se o tempo quiser.
                   

quarta-feira, 11 de julho de 2012

reloj'aria



                                                                        arte de andy warhol
                       

3.

impressionante sua pressa
de eternidade: nada dura
tanto, a ponto (o que nasce ou cessa)
de eterno que paira e perdura.

o que fica respira e finda:
restar também é ser medido
(escoar-se, deixar de ser)
por vão, metódico, insensível,

ponte-safena no infinito,
relógio de parede que
(sob o solo ou sob o sol: EX

sob o solo ou sob o sol: VIDA),
mesmo ao que ainda irá viver,
cante a contagem regressiva.
           

terça-feira, 10 de julho de 2012

é hoje!
























Corroendo
As grandes escadas
Da minha alma.
Água. Como te chamas?
Tempo.

Vívida antes
Revestida de laca
Minha alma tosca
Se desfazendo.
Como te chamas?
Tempo.

Águas corroendo
Caras, coração
Todas as cordas do sentimento.
Como te chamas?
Tempo.

Irreconhecível
Me procuro lenta
Nos teus escuros.
Como te chamas, breu?
Tempo.

        
             HILDA HILST 
             (Da morte. "Odes mínimas". São Paulo: Globo, 2003.)