segunda-feira, 18 de março de 2013

antônio machado

              
        
AS MOSCAS
 
     
Vocês, moscas familiares,
onde a fome sempre pousa,
vocês, as moscas vulgares,
me evocam todas as coisas.

Oh, velhas moscas vorazes,
como abelhas em abril,
velhas moscas pertinazes
em minha calva infantil!

Moscas daquele fastio
pela sala familiar,
as claras tardes de estio
em que me pus a sonhar!

E na aborrecida escola,
ágeis moscas divertidas,
perseguidas
por amor do que decola,

– que tudo é voar –, sonoras
esbarrando nos cristais
pelos dias outonais...
Moscas de todas as horas,

de infância e adolescência,
da juventude dourada;
desta segunda inocência,
que nos leva a crer em nada,

de sempre... Moscas vulgares,
a quem, de tão familiares,
não há um digno cantor:
bem sei que vocês pousaram

sobre os jogos encantados,
o livro escolar fechado,
sobre uma carta de amor,
sobre as pálpebras rígidas
dos que jazem já sem vida.

Inevitáveis gulosas,
que nem lavram como abelhas,
nem são belas mariposas;
pequeninas, revoltosas,
só vocês, amigas velhas,
me evocam todas as coisas.  
           
versión: r.m.

Um comentário:

  1. Oi Ro!
    Adorei a poesia, como sempre!
    Nos conhevemos a uns 5 anos atras na quinta
    Me manda um e-mail: renatamanoela@live.com
    Bjos

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