sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

roseana

                                                 
             só os animais são eternos.
                                   jorge luis borges

                refaço estória e ritual, com licença:
                eu o sepulto também
                aqui, no torrão raso
                da página,
                sob a palavra “asa”
                       em lugar de terra.


foi ana rosa que contou. história simples de passarinho. como os passarinhos.

desceu uma tarde em seu quintal um periquito. auriverde.
não!
cárdeo-cardíaco, sob o sol das quatro. na sombra,
musgo apodrecido.
      
inquieto, ágil, como de resto as aves
                                                        diminutas, por regra. um cavalo.
     
mas ficou logo escarrado: que era dócil, doméstico de ontem, solto, fugido.
não era espanto estar próximo, não se alarmava, não voou para longe,
para o: exato.

ficou ali, na imortalidade. relapso. fato estúpido.
livre, no instante, era um não ser
                                                                                                    solitário.
como um cão.

notou (a rosa) que ele deslumbrava, transcendido de horizontes,
bem-assombrado. e ana também. deslumbrava.

mas
em contrário – mulher forte e firme, acostumada à voragem da vida –, o passarinho era um coração pequeno, nada mais. para aquela alegria, súbita e vertigem,
a musculatura frágil e
desusada.

peixe morto. 
      
                – deve ter voado o dia todo, coitado. não aguentou – ela disse.        

também me arrepio.
de já haver conhecido periquitos alucinados.

é verdade, morreu de exaustão. de inadvertido, inexperiente.
no entanto, que sou incorrigível
e desconcertado, por isso eu acho:
morreu de vida.
    
           (cavalo, cão, peixe 
            e pássaro.)

morreu
de eternidade.
         
            *** 
               
depois, e foi só, ana o enterrou com umas mãos de terra e folhas secas
no quintal da casa.

(pássaro ruim, 2009)
       

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