domingo, 10 de novembro de 2013
o verão
a luz do sol e das luas de cloro varou a escuridão de nossas roupas. parece até um crime. talvez dissesse algum menino olhando pela fresta: um assassinato. e somos mais ou menos delicados. e estamos felizes.
tu começas pelos lábios, carne sobre carne (a lânguida liquenografia da língua). os lábios são o fruto que se colhe com os lábios.
árvore de ossos, vento. esta macieira é o único livro que li na vida.
sou um lenhador implausível, comovido, de mãos nuas. (ou és tu, com a serra elétrica de hálito & sussuros, com teu machado de maciezas & calores & perfumes, a lenhadora que me derruba?)
teu corpo jazz na relva. meu corpo jazz na relva.
e cavo um bunker no domingo de tua virilha. e deixo minhas mãos pastarem como bois famintos.
as coxas cheiram a terra molhada. no pescoço és uma égua, haste doente. teus mamilos são despenhadeiros.
folheio o corão de teus cabelos. estou vivo, como quem autentica a própria morte no cartório das veias.
a vida é enorme, minha amiga, a vida nos acontece à queima-roupa.
deus existe por alguns instantes? é a palavra de silêncio, o grafite de néctar no muro das costas? a cama é um bosque onde o perfume lança âncoras de hera.
separar as pernas, abrir a caixinha de música de tuas súplicas. ah, a boceta! uma fogeira no centro do corpo, do quarto, da galáxia, dos séculos.
eu sei, sou um cego, um analfabeto. nosso esqueleto é um relâmpago.
subirei todas as escadas de tua nudez? sonhar, floração de tesouras. os óculos no chão. meu coração é um cavalo escoiceando a caixa torácica. uma ave que bate contra o vidro.
de repente, nem isso. resfolegante, calmo, um pouco triste (temos a idade de um crepúsculo). o cavalo exausto sobre o campo, o cavalo exausto na colina. um pássaro que lateja – & a morte tem quase o tamanho da vida – sobre a réstia de sol que atravessa a cama.
(poema revisitado: pássaro ruim, 2009)
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