segunda-feira, 19 de setembro de 2011
william carlos williams
O PARDAL
(A Meu Pai)
Este pardal
que vem pousar em minha janela
é uma verdade mais poética
do que natural.
Sua voz,
seus movimentos,
seus hábitos -
como gosta de
sacudir as asas
na poeira -
tudo o atesta;
admito que o faça
para livrar-se de piolhos
mas o alívio que experimenta
leva-o
a gritar saudavelmente -
um traço que tem
mais a ver com música
do que com outra coisa.
Onde quer que se encontre
no início da primavera,
em becos obscuros
ou diante de palácios,
ele logo se entrega
sem afetação
aos seus amores.
Tudo começa no ovo,
seu sexo o engendra:
Que haverá de mais pretenciosamente
inútil
ou de que
tanto nos vangloriemos?
Ele acarreta as mais das vezes
nossa perda.
O galo novo, o corvo com
as suas vozes desafiadoras
não conseguem ultrapassar
a insistência
do seu pipilo!
Certa ocasião
em El Paso
ao cair da tarde,
eu vi - e ouvi! -
dez mil pardais
que tinham vindo do
deserto
empoleira-se ali. Lotaram as árvores
de um pequeno parque. As pessoas fugiram
(ouvidos a tinir!)
dos seus dejetos,
deixando o local
entregue aos crocodilos
que viviam
na fonte. A imagem dele
é tão familiar
quanto a do unicórnio
aristocrático, e é pena
que não mais se coma aveia
hoje em dia
o que tornaria a vida
mais fácil para ele.
Nisso,
seu pequeno porte,
seus olhos penetrantes,
seu bico prestimoso
e sua agressividade
garantem-lhe a sobrevivência -
para nada dizer
de suas inumeráveis
ninhadas.
Até os japoneses
o conhecem
empaticamente,
com profunda compreensão
de suas características
menores.
Nada de sutil
sequer remotamente
na sua corte amorosa.
Ele se agacha
diante da fêmea,
arrasta a asa,
valsando, e alça
a cabeça
e simplesmente -
berra! O alarido
é terrível.
O modo como esfrega o bico
numa prancha
para limpá-lo,
é resoluto.
Assim também tudo o mais
que faça. Seus supercílios
acobreados
dão-lhe um ar
de ser sempre
um vencedor - no entanto
eu vi certa vez
uma fêmea da espécie,
aferrando-se, decidida,
à beira de
um cano d'água,
agarrá-lo
pelas penas do cocoruto
e mantê-lo
calado,
subjugado,
suspenso sobre as ruas das cidade
até
ficar quites com ele.
Qual a utilidade
disso?
Ela ficou dependurada ali,
ela própria
admirada de seu feito.
Eu me ri com gosto.
Prático até o seu desfecho
é o poema
da existência dele
que triunfou
finalmente;
um punhado de penas
aplastado no calçamento,
asas simetricamente abertas
como em pleno voo,
sem cabeça,
o negro escudo do peito
indecifrável,
uma efígie de pardal
uma pasta seca apenas,
deixada ali para dizer
e o diz
sem ofensa,
lindamente;
Isto era eu,
um pardal.
Fiz o melhor que pude;
adeus.
tradução: josé paulo paes
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