terça-feira, 15 de maio de 2012

fabrício carpinejar

     
O livro é de 2045, escrito aos 72 anos.
Como posso ter morrido antes, decidi antecipar a velhice. 
(carpinejar)

*

DÉCIMA ELEGIA

Só na velhice o vento não ressuscita.
A água dos olhos entra na surdez da neve
e escuta a oração do estômago, dos rins, do pulmão.

O sono desce com a marcha dos ratos no assoalho.
Tudo foi julgado e devemos durar nas escolhas.

Só na velhice os grilos denunciam o meio-dia.
O exílio é na carne.

Esmorece o esforço de conciliar a verdade
com a realidade.
A neblina nos enterra vivos.

(...)

Só na velhice a forma está na força do sopro.
Respeito Lázaro, que a custo de um milagre
faleceu duas vezes.

O medo é de dormir na luz.
Lamento ter sido indiscreto
com minha dor e discreto com minha alegria.

Só na velhice a mesa fica repleta de ausências.
Chego ao fim, uma corda que aprende seu limite
após arrebentar-se em música.
Creio na cerração das manhãs.
Conforto-me em ser apenas homem.

Envelheci,
tenho muita infância pela frente.

                       
                         FABRÍCIO CARPINEJAR               

Um comentário:

  1. Denso, "dramático refinado", cheio de imagens, hiperbólico muitas vezes, aproximação metafórica ou metonímica de coisas distantes improváveis, e sem ritmo aparente que não seja o ritmo do pensamento.
    Parece-se muito à tua poética.
    Coisa fina este poema.

    abç

    rods.

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