sexta-feira, 21 de outubro de 2011
poética
1
o poema é filho
de um só pai.
a liberdade também
desfralda asas
em acidez de solidão.
o poema é parto
que desse à luz um mistério:
qual bela criança, retorta!
e pouco importa
se menino jesus
que bebê de rosemary.
2
o poema ergue-se
para baixo.
não escavado como um fojo de feras.
desce como um rio que encorpa,
adianta-se ao sumidouro.
o poema ergue-se
para baixo,
até a réstia sob a porta,
tudo que é vista ofuscada.
chega à grafia do ponto,
à pedra do caminho:
o olho que fecha,
o olho que abre,
o pináculo,
a bola de haxixe
como fibrose, cabeça de alfinete
ou marimbondo.
continua, se quiser,
para viver o desmaio
daquele pássaro.
3
e assim, nas pontas dos bisturis,
vou cosendo sentidos,
lavrando traumatismos.
pontuo como bem quero,
espulgo o teor preciso -
pronúncia a pronúncia, brusquidão
a brusquidão.
(e pra quê?)
antes de abandonar o poema,
tamarindo espremido,
casca de cigarra,
sequer percebo o que calo
quem vai dizendo.
tudo quanto tranço, a percutir
as vigas aos restos
são apenas fios do que somos,
que sou também
da autoria de meus versos.
4
primeiro cuspo.
a destilação vem depois,
transmudando em sangue.
eu e o que sou sem me conhecer
compartilhamos agulhas
numa transfusão de sonho.
(sou da autoria de meus versos.)
5
poesia é tanger o violino
com um estilete.
6
há quem tenha buscado
a pedra de toque,
o verbo atrás do verbo,
o silêncio dentro do silêncio,
o caroço da língua.
houve quem tenha inventado
o lírio
e da espinha do peixe
forjado uma canoa
e erguido raízes (como patamares)
às lindes do firmamento.
houve quem macerava
a fruta
por que pingasse o último mel.
me admira como ficou
o gosto da sede
e como
nem mesmo a eternidade
foi suficiente.
7
não desconfieis dos poetas!
são barcas sobre os telhados.
sua loucura é o dia-a-dia
do trabalhador.
* primeiro poema do primeiro livro (sol sem pálpebras, 2007)
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o poema dos poemas,
ResponderExcluirótimo!
perfeito!
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