segunda-feira, 2 de abril de 2012

"o azul de antes"

                          


* entrevista concedida a bárbara lia (Cronópios, 16/11/2008)
             
       
Estamos todos exilados na infância? (...) A infância está sempre à porta dos seus poemas pedindo para entrar? Os escritores e poetas estão sempre exilados no azul de antes?
             
A infância está em tudo. Em cada gota de sangue e de tinta. Assim como o cadáver. Tenho muito o que aprender com o menino que fui. 
Gosto de reinventar minha infância, às vezes desbragadamente, o que aliás todo mundo faz em menor ou maior grau, com total dedicação à verdade. Quantas vezes a criança inventou o adulto? Bombeiro, jogador de futebol, trapezista. Eu escrevi isso num raro lance de lucidez: “minha infância eu a invento enquanto lembro”. Eu era uma criança particularmente mentirosa. Pergunte pros meus pais. Escrever é também niná-la ou repreendê-la. No nosso universo psíquico a coisa funciona sem muita linearidade. A criança de 8 anos sussurra algo para o rapaz de 17. O homem de 25 consola o adolescente de 14. É assim que se passa. Portanto, creio que ainda estou inventando minha infância. 
Agora, é um exílio. Não acredito em vida após a morte. Acho que percorremos este caminho do ventre materno ao útero da Mãe Terra. Neste intermeio, somos cuspidos de exílio em exílio: do ventre, da infância, da adolescência, da mocidade, da madureza e, por fim, da vida. Quando nos sentimos em casa, o tempo nos lança numa nova zona de estranhamento. O paraíso só existe quando o lamentamos.
Mas não creio que a infância, apesar de mágica e mítica, apesar de “impregnada de eternidade” (m. bandeira), seja um período necessária ou integralmente feliz. A infância não é um paraíso perdido. Há muita tristeza também, muito medo, brutalidade e insegurança. Um filme lindíssimo do Carlos Saura, “Cría Cuervos”, fala bem sobre isso, sobre  a morbidez, ainda que ingênua, que pode haver na infância. O menino também tem muito o que aprender com o homem.
   
*
para ler a entrevista na íntegra

Nenhum comentário:

Postar um comentário