Ontem à tarde, o STF finalmente – sete anos e mais de 20.000 páginas de documentos
e depoimentos depois – condenou a cúpula do PT pelos abusos e improbidades do
mensalão. Ao mesmo tempo, em São Paulo, José Genoino
e José Dirceu eram ovacionados por seus correligionários em encontro nacional
do partido.
Apesar da ridícula reação de petistas,
insuflados por uma retórica oca e fanática que os leva a chamar de golpismo o
cumprimento da Constituição e das atribuições do Supremo, justiça vem sendo feita. Os três petistas foram enfim condenados – Lula só escapou pois,
inacreditavelmente, ficou no "ponto cego", encoberto por sua
popularidade, pelo "pop-lulismo", ou populismo simplesmente.
Mesmo que esses dirigentes não "puxem
cana", já é possível cantar vitória: é um exemplo, modelo para o presente
e o futuro, a condenação de peixes assim graúdos, de tão importantes colarinhos
brancos; algo, aliás, que o próprio PT, à época em que o partido posava de "única vestal no puteiro", sempre cobrou.
Em cartas abertas, Genoino e Dirceu – e olha que eu já os admirei por
sua resistência à ditadura! – inverteram os sinais e acusaram de golpismo
aqueles que apuraram, processaram e condenaram o golpismo de seu próprio partido.
Todos os implicados atentaram contra um
princípio basilar da democracia, a independência dos três poderes, comprando
com propinas apoio político para seu projeto de poder.
Senão, vejamos o que disse Ayres Britto,
presidente do STF, ao fim de seu voto: foi ferido "o conteúdo mais
eminente da democracia, que é a República, o republicanismo, que postula a
possibilidade de renovação dos quadros e dirigentes e a equiparação, na medida
do possível, das armas com que se disputa a preferência do voto popular (...) [O objetivo do esquema era] um projeto de poder quadrienalmente quadruplicado. Projeto de poder de continuísmo seco, raso. Golpe, portanto."
Além deles, parlamentares, banqueiros e
empresários também foram condenados. E tudo transmitido em tempo real, pela
televisão, na íntegra, para quem quisesse acompanhar. Isso é ou não é
novo em um país culturalmente estamental e aristocrático como o nosso?
O julgamento do mensalão não é outra coisa que uma conquista,
um precedente jurídico no mínimo auspicioso na história do Brasil. Também significativo é o fato de que sete dos dez ministros do STF tenham sido indicados por Lula ou Dilma Rousseff, e que tenham, mesmo assim, fugido aos arreios e constrangimentos do poder executivo.
Se forem necessários, que venham outros processos e condenações por corrupção ativa e passiva, sejam os implicados petistas ou tucanos, pmdbistas ou "democratas" (DEM). Oxalá realmente deixemos, com o tempo e a prática autocrítica e corajosa, de ser a nação do rapapé e do beija-mão. Oxalá estejamos vivenciando uma autêntica quebra de padrões culturais, ainda que incipiente, na contramão do patrimonialismo e de nossa herança ao mesmo tempo autoritária e bunda mole: a fundamental separação entre o público e o privado, entre o interesse nacional e os interesses pessoais ou partidários.
Se forem necessários, que venham outros processos e condenações por corrupção ativa e passiva, sejam os implicados petistas ou tucanos, pmdbistas ou "democratas" (DEM). Oxalá realmente deixemos, com o tempo e a prática autocrítica e corajosa, de ser a nação do rapapé e do beija-mão. Oxalá estejamos vivenciando uma autêntica quebra de padrões culturais, ainda que incipiente, na contramão do patrimonialismo e de nossa herança ao mesmo tempo autoritária e bunda mole: a fundamental separação entre o público e o privado, entre o interesse nacional e os interesses pessoais ou partidários.
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